O Sacramento da Reconciliação - V

quinta-feira, 9 de setembro de 2010
Continuamos a refletir sobre o sacramento da Reconciliação. Já vimos que é necessário, para uma confissão válida e frutuosa, uma sincera contrição e uma confissão transparente dos pecados. Vejamos, agora, um terceiro elemento, necessário para a celebração do Sacramento: a satisfação, isto é, aquele gesto de penitência que o penitente realiza por ordem do confessor. Qual o significado dessa satisfação?
A satisfação é um ato concreto que alguém realiza para corrigir e reparar um erro ou uma injustiça cometida. Qual é o seu sentido? Trata-se de um ato de justiça. Vejamos: quando se faz o mal a alguém, não basta pedir desculpas; é necessária uma reparação. Se eu roubei, é necessário devolver, se caluniei, é necessário reparar a calúnia. Isto é claro, esta necessidade de satisfação.
Mas, vejamos ainda mais. O pecado é uma ruptura com Deus e os irmãos, pois além de desprezar, em certo sentido, Deus e o seu amor, fere também a Igreja, comunidade de irmãos. Todo pecado traz dano não somente à pessoa, mas também á Igreja e á humanidade toda. Ao pecar, eu não somente me fecho para a graça de Deus, para a sua vida, mas torno-me também como que um canal entupido, fechado: nem acolho a graça nem permito que, através de mim, da minha vida e do meu exemplo, esta graça chegue aos meus irmãos, à Igreja e ao mundo. Não há pecado tão íntimo e pessoal que não tenha repercussões comunitárias. Vejamos um exemplo: quando eu peco, fecho-me à graça, fico mais frio e mais débil. Ora, não somente minha vida afasta-se do Senhor, mas também os que me cercam entram em contato com meu mau exemplo ou se privam do meu testemunho, do meu entusiasmo e até mesmo do meu trabalho em prol do Evangelho. Assim, meu pecado é sempre um mal para mim, para a Igreja e também para toda a humanidade. Por isso, é necessária uma reparação que me ajude a corrigir as conseqüências do pecado em mim como também uma reparação pelo mal feito à igreja e à humanidade.
Uma questão ainda: como o pecado deixa em mim uma necessidade de reparação e satisfação? O pecado, além de ser um ato contrário á vontade de Deus, deixa marcas na pessoa que o comete. Por exemplo: quando eu cedo a um vício, mesmo tendo feito a confissão e recebido o perdão, o fico mais dependente daquele vício... o pecado deixou suas marcas. É aí que entra o sentido da satisfação: é um modo de participar ativamente do combate às conseqüências do pecado em mim! É assim que o Catecismo se exprime: “Perdoado de seu pecado, o pecador deve ainda recuperar a plena saúde espiritual. Deve, portanto, fazer algo a mais para reparar as próprias culpas, deve “satisfazer” de modo adequado ou “expiar” os seus pecados. Tal satisfação chama-se “penitência”. A penitência que o confessor impõe deve levar em conta a situação pessoal do penitente e procurar o seu bem espiritual. Ela deve corresponder, o quanto possível, á gravidade e á natureza dos pecados cometidos. Pode consistir na oração, em uma oferta, em obras de misericórdia, no serviço ao próximo, em privações voluntárias, em sacrifícios e, sobretudo, na paciente aceitação da cruz que devemos suportar. Tais penitências ajudam-nos a nos configurar a Cristo, ele que é o único que expiou os nossos pecados uma vez por todas” (n. 1460). Este texto explica muito bem o sentido da satisfação: é aquela penitência que o padre nos dá ao fim da confissão. Ela é um modo de lutar contra a nossa tendência ao pecado e suas conseqüências. O padre deve levar em conta, para determinar tal penitência, a natureza e a gravidade do pecado. Não deve ser uma coisa automática, mecânica, tipo “reze três ave-marias...” Dependendo do pecado, pode-se sugerir um salmo ou a leitura espiritual de algum texto da Escritura que tenha relação com aquele pecado, pode-se determinar uma obra de caridade ou de penitência... Cabe ao confessor avaliar isso.
Uma coisa importante o Catecismo deixa clara: a reparação pelos nossos pecados foi feita de modo perfeito e definitivo pelo Cristo: só ele tira o pecado do mundo e somente por ele temos o perdão. A satisfação que realizamos é um modo de participar do combate contra o pecado e de exprimir nosso desejo de participar na obra redentora do Cristo Jesus, pois aquele Cristo que pode nos salvar sem a nossa ajuda não quer nos salvar sem a nossa participação, sem nossa vontade e liberdade! O Concílio de Trento expressou isso muito bem: “Nossa satisfação, aquela que pagamos por nossos pecados, só vale por intermédio de Jesus Cristo, pois, não podendo coisa alguma por nós mesmos, ‘tudo podemos com a cooperação daquele que nos dá força’ (Fl 4,13). E, assim, não tem o homem de que se gloriar, mas toda a nossa ‘glória’ está em Cristo... em quem oferecemos satisfação, ‘produzindo dignos frutos de penitência’ (Lc 3,8), que dele recebem seu valor, por Ele são oferecidos ao Pai e graças a Ele são aceitos pelo Pai”. Recordemos que o próprio Senhor Jesus nos exorta à penitência, à vigilância, ao combate espiritual. Dizer que o Cristo é nosso único Salvador e que somente por Ele podemos ter o perdão e nossos pecados não nos dispensa de modo algum de participar, com todo o nosso ser, da obra do Senhor Jesus. Já São Paulo nos recorda isso ao afirmar: “Eu completo na minha carne o que falta das tribulações de Cristo” (Cl 1,24).
Uma última observação: sem a prática da satisfação que o sacerdote estabelece, o Sacramento fica incompleto e sua eficácia, anulada.

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